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O que são animais silvestres, selvagens e exóticos?

 

Durante a revisão do texto sobre Saúde Única, surgiu a dúvida sobre quais seriam as diferenças entre animais silvestres, selvagens e exóticos.

Em uma pesquisa no Google, eu encontrei um artigo muito didático, que o autor, Professor Armando José Capeletto, gentilmente me autorizou a reproduzir aqui.

 

 

O que são animais silvestres?

Armando José Capeletto

http://www.bioclima.info/silvestr01.php

 

Os termos aplicados aos animais, “selvagem” ou “doméstico” e “silvestre” ou “exótico”, frequentemente são usados de maneira incorreta pelo leigo. Geralmente exótico é aplicado a animais de cores e formas bizarras; doméstico é o mesmo que manso; e selvagem e silvestre são usados indistintamente, como sinônimos.

Mesmo na literatura especializada e em eventos científicos, esses equívocos ocorrem, gerando confusão quando se pretende qualificar uma espécie animal, seja da fauna brasileira ou não.

Para aplicar esses termos corretamente em uma pesquisa científica, por exemplo, deve-se, antes de tudo, entender o que significa cada um. O objetivo deste texto é apresentar uma proposta de terminologia baseada na legislação ambiental, que possa ser adotada por todos os que lidam com animais selvagens e/ou silvestres, incluindo os médicos veterinários.

Por exemplo, um filhote de leão separado da mãe e criado pelo homem pode ser considerado um animal doméstico? Muitos dirão que sim, mas estarão enganados.

A primeira distinção a ser feita é que esses termos não têm relação com o grau de docilidade e mansidão do animal. Por exemplo, filhotes de anta (Tapirus terrestris), apanhados pequenos, habituam-se a conviver com o homem e seguem o dono como um cão – tornam-se mansos, porém, continuam a ser animais silvestres e selvagens.

Já um bezerro, potro ou leitão, abandonados pelo dono ou fugitivos, degeneram rapidamente em seu comportamento, tornando-se ariscos e agressivos ao homem.

Mas são ainda animais domésticos.

Algumas definições do dicionário talvez ajudem a desfazer o “ïmbróglio”:

Animal doméstico:  “Diz-se do animal criado pelo homem a fim de lhe servir no trabalho ou fornecer-lhe seus produtos: lã, leite, ovos etc.”

Pepe
Pepe, um gato (Felis catus) feral da minha colônia, com a orelha marcada para identificação da castração. Exemplo de animal exótico e doméstico.

Para ser considerado doméstico, um animal deve ser criado pelo homem para uma certa finalidade, o que implica que sua reprodução e genética são controladas. Ao longo de muitas gerações, a aptidão do animal foi reforçada, melhorada e, muitas vezes, totalmente modificada por meio de cruzamentos seletivos.

O processo de domesticação de uma espécie demora décadas ou séculos, exigindo trabalho meticuloso de seleção artificial, muito frequentemente, levando à extinção da espécie em seu estado selvagem, como ocorreu com o cão, o boi e o cavalo, por exemplo.

Considere-se o caso do cão (Canis familiaris): existem mais de 305 raças caninas reconhecidas internacionalmente, além de muitas outras raças regionais, aceitas apenas em seus países. Cada uma dessas raças tem padrões morfológicos, anatômicos e comportamentais bem definidos e os cruzamentos devem ser feitos de maneira controlada, com registro dos ascendentes até a terceira ou quarta geração, a fim de garantir a pureza da raça. Este é um animal doméstico típico.

Aquele leãozinho que foi adotado por um circo ou por uma família humana habitou-se a conviver com o homem, tornando-se relativamente dócil. Mas a espécie leão (Panthera leo) continua a ser selvagem.

Animal selvagem: “Que não está domesticado; bravo.”

Esta definição confunde novamente as coisas, pois mistura domesticação com docilidade. Proponho separar esse verbete em dois:

Animal selvagem é aquele que ainda habita seus ecossistemas de origem, constituindo populações sujeitas à seleção natural, cuja reprodução e genética não foram controlados pelo homem.

Animal feroz ou (bravio) é aquele cujo comportamento é agressivo e oferece perigo ao homem.

Animais domésticos abandonados pelo homem ou que fugiram do cativeiro podem retornar ao estado selvagem, reproduzindo-se livremente e voltando a ser selecionados pelo meio. Nesse caso, são chamados de animais ferais.

Por exemplo, isso ocorreu com o mustang ou cavalo norte-americano (os próprios norte-americanos o denominam de The american feral horse); com o dingo australiano, descendente do cão levado pelos primeiros aborígenes; e com o porco-monteiro (porco feral brasileiro), temido no interior do Mato Grosso e Estados do Sul pela sua ferocidade. No Brasil existem ainda cavalos, bois e até búfalos ferais, no Pantanal e na Ilha de Marajó.

Silvestre: “adj. m.+f. (lat. silvestre) 1. Da selva ou mato selvático. 2. Que cresce ou nasce, ou dá flores ou frutos, sem cultivo: Plantas silvestres; figueira silvestre. 3 Que se criou ou nasceu sem cultivo, no meio das selvas ou plantas. 4 Que se desenvolve nos bosques ou florestas. 5 Que não dá frutos; bravio, inculto, agreste.”

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Gambá-de-orelhas-brancas (Didelphis albiventris) – animal selvagem e silvestre – Fotografia de Geraldo França Jr. feita em área de proteção ambiental particular, Piracicaba, SP

Exótico: “adj. (gr. exotikós) 1. Diz-se do animal ou da planta que não é natural do país onde vive. 2. Procedente de país estranho. 3. De mau gosto. 4. Desajeitado. 5. Esquisito, extravagante.”

Essas definições não esclarecem a diferença entre selvagem e silvestre, mas já eliminam o uso da palavra exótico para animais da fauna brasileira.

Afirmar que “as matas brasileiras são habitadas por centenas de tucanos, papagaios e outros pássaros exóticos” só tem sentido se dito por um norte-americano ou europeu, tomando como referência seu próprio país; são comuns os textos traduzidos que fazem tais afirmações. Se tomarmos o Brasil como referência, tucanos e papagaios não são exóticos, mas silvestres. Esta é a interpretação da legislação, que deve ser adotada tecnicamente.

 

O que diz a lei

A Lei 9.605/98, conhecida como lei de Crimes Ambientais, em seu Artigo 29, Parágrafo 3º, define animais silvestres com clareza: “são espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras”.

Portanto, as oposições selvagem x doméstico e silvestre x exótico não são excludentes, podendo existir quatro combinações, como nos exemplos abaixo:

  • O leão é um animal selvagem e exótico, originado da África;
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Leão-africano (Panthera leo) – animal selvagem e exótico Fotografia de Geraldo França Jr, feita no Parque Nacional Serengeti, Tanzânia
  • O cão é um animal doméstico e exótico, originário do lobo eurasiano e introduzido no Brasil após o Descobrimento;
  • A anta é um animal selvagem e silvestre, pois sua distribuição geográfica original inclui a maior parte do território brasileiro;
  • O pato (Cairina moschata) é uma ave doméstica e silvestre, pois os portugueses já o encontraram sendo criado pelos índios e o levaram para a Europa; é um dos raros silvestres domesticados, até o momento.
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    Pato-do-mato (Cairina moschata) – fêmea e filhotes. Ave doméstica e silvestre. Fotografia de Geraldo França Junior feita no rio Piracicaba, SP.

Uma última ressalva é quanto às raças de animais domésticos desenvolvidas no Brasil – o fila brasileiro, o mangalarga, o gado caracu, entre outros, são raças brasileiras, porém, as respectivas espécies biológicas a que pertencem (cão, cavalo e boi) continuam sendo exóticas, pois não faziam parte da fauna brasileira original.

 

 

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